O DIABO QUE TE
CARREGUE
Capítulo 7
A Invenção da
Personificação do MAL
No Novo
Testamento predomina a visão dualista, que vem da influência grega de Platão
(428-348 A.E.C.), que por sua vez bebeu na fonte do dualismo persa de Zoroastro
(630 A.EC.). Existe ainda uma vasta literatura sobre os "anjos caídos", muito
explorado nos chamados livros apócrifos de Henoc, mas prefiro não me aprofundar
nisso com esse texto aqui.
O dualismo entre
o bem e o mal só ficou bem definido no cristianismo. Agora o Deus de Jesus é o
Deus do amor, da misericórdia e do perdão. Mas esse conceito não se coaduna com
o conceito dos antigos hebreus. Por outro lado, o Deus de Jesus não pode ser o
Deus dos exércitos, da guerra, o Deus das chacinas, o Deus borrifado de sangue,
dos sacrifícios, que faz pacto de pele de pênis, sacrifício do próprio filho,
mandamentos impossíveis etc.. Deus agora, não podia ser o responsável pelo mal.
Aqui a figura do mal é essencial para a construção teológica definir a imagem do
Diabo, que viria a personificar única e exclusivamente o mal. Como fizeram isso?
Talvez a resposta mais evidente é observarmos como se construiu a imagem do seu
antagonista: Jesus, o Cristo. Ambas as fórmulas empregadas foram muito
parecidas, no mesmo momento, evoluindo paralelamente, de concepções inversas,
obviamente.
E agora vamos
entrar na parte mais difícil de todo esse trabalho. Por quê? Porque vamos fazer
a única coisa que podemos fazer quando tentamos desvendar, de forma séria, uma
história (a maior de toda humanidade) da qual temos parcas evidências, pouco
material arqueológico e, nada, absolutamente nada de provas; professar o
passado. De quebra, temos contra os cientistas e arqueólogos (até teólogos
sérios), um forte desinteresse em expor a verdade por quem mais deveria querer
saber: os fiéis. Para eles quase tudo se resume em acreditar. O trauma cerebral
é muito forte. O choque de realidade seria insupotrável.
Não dá para fazer
nem mesmo um resumo sério sobre Jesus e o cristianismo. Pois teríamos de abarcar
questões que, por si só, dariam (e deram) volumes de livros, como Ressurreição,
por exemplo. Então, vou me ater apenas na questão da construção da imagem do
Demo; do Diabo. Vamo que vamo.
Novamente, se
formos pesquisar usando a Bíblia como fonte, a pergunta é: como será possível
descrever toda a atuação do Diabo no Antigo Testamento? Com base em quê? Supondo
que não existisse o Novo Testamento, a questão é a seguinte: como, por exemplo,
Moisés, Abraão, Noé e outras passagens bíblicas que "viveram" aquele período
tiraram algum conceito sobre Satanás ou Diabo se não há nada registrado sobre a
figura do mal? Resposta: NÃO TIRARAM. Nós não vemos ninguém, nem mesmo o faraó,
atribuindo as dez desgraças no Egito a Satanás. Mas está escrito o nome do
responsável, certo? O próprio Javé! Ou não?
"E o dualismo se
fez verdade e habitou entre nós!" (?).
Mas o Deus dos
cristãos continua sendo o criador do Universo, aí incluindo tudo o que existe, e
nesse tudo também o MAL. Como resolver esse impasse? Simples: aqui o "Livre
Árbitro" se fez verdade e habitou entre nós, pronto! Sem a teoria do Livre
Árbitro o atual edifício teológico não se sustenta. Escolha; Deus ou Diabo? O
bem ou o mal? E esqueça o que está escrito!
Mas, quem estaria
interessado nisso? Quem estaria preocupado com esse turbilhão de misticismos que
impregnava toda aquela região dominada pelos romanos? Afinal, vários candidatos
a messias apocalípticos eram cruscificados todos os dias, mesmo algumas décadas
antes do próprio Jesus aparecer por aquelas bandas. E até mesmo religiões
aparecem e desaparecem com o sabor do vento. Sempre foi assim. Isso foi se
arrastando, até que chegamos no século IV. No início deste século, houve no
mínimo três acontecimentos cruciais que viriam transformar culturalmente a
história do mundo: a ascensão de Constantino como imperador único de Roma; sua
conversão ao cristianismo e o Concílio de Nicéia, no ano 325. Neste Concílio foi
decidido, não só sobre a divindade de Jesus, o Cristo, como foi, a partir dali,
sendo também construída a imagem do seu antagonista; o Diabo.
Paulo, uma
personagem supostamente real, teve sua imagem reforçada e legitimada como
apóstolo (já que Paulo não conheceu Jesus) no Concílio Niceno também. Paulo
(muitos estudiosos entendem 'romanos'), esta figura "misteriosa", é quem vai
transformar o cristianismo mais "palatável" ao gosto dos inimigos judeus; os
romanos, e ao gosto do mundo ocidental, mais adiante -- cristianismo este que
não perderá de vista a evolução de outra personagem de suma importância: o
Diabo.
O Diabo só vai
tomar forma, de "fato", no Novo Testamento, na pessoa de Jesus.
RICHARD HOFFMAN
RICHARD HOFFMAN
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